segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Passado, Presente e Futuro

Bandeira disse:

Passado, Presente e Futuro

Só o passado verdadeiramente nos pertence.
O presente... O presente não existe:
Le moment où je parle est déjà loin de moi.
O futuro diz o povo que a Deus pertence.
A Deus... Ora, adeus!


(Manuel Bandeira - Estrela da tarde)


Muitas pessoas saudosas gostariam de voltar ao passado para reviver momentos especiais. Outras, revoltadas com suas escolhas em tempos antes desejariam ter uma borracha e excluir as vivências passadas. 

Eu não desejo voltar ao passado, ele é a tatuagem que nunca tive coragem de desenhar no corpo, mas carrego cada traço em minha pele, cada dor, cada mar, cada sol, sangue, chuva e pedra. Ficar em paz com minhas janelas fechadas faz de mim mais reflexiva. Todos nós temos o mistério de não esquecer ou esquecer demais. 

Não pretendo fazer nenhum tratamento com o Doutor Howard Mierzwiak. Precisamos da memória, fragmentada, recortada, nítida, fantasiosa, ilusionista...seja como for...é necessário conhecer o nosso ontem.

O presente é passado a cada instante, só nos cabe: o escudo, o livro, o mundo, os medos e a fé para tracejar a nova linha.


domingo, 1 de dezembro de 2013

Intertextualidade com Bandeira

Provinciana que nunca soube
Escolher bem suas falas;
Potiguar, a quem repugna
a mente atrasada de muitos natalenses;
Poeta ruim que na arte da vida,
Envelheceu antes de viver;
E até mesmo quando criança
Já sabia embranquecer;
Professora falhada, pesquisadora
Falhada (engoliu um dia
Um poema, mas os versos não foram digeridos);
Família grande;
Sempre quero ficar sozinha.
Muita inquietação no espírito.

Que vem do natural,
E em matéria de profissão
Não sabe o que dizer
Não. 

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

A vida deveria ser menos dolorida
e o verso é só
porque não há nada para acrescentar nesse mundo de corridas
só se corre
e assim se morre cada vez mais.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Poema para Bandeira

Campanha, Teresópolis, Quixeramobim, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Ceará
Onde?
Onde encontrar melhor ar?
Onde encontrar melhor teto?

a cobertura
arquiteto
feita de palavras
um chão de mágoas
desfeitas com café e alfenim

e há a cruz
tem Jesus
e santos compondo fé
até quando a indesejada chegar

por oitenta primaveras e mais
pôde plantar estrelas noturnas e diurnas
em tantos quintais

carnavais com terças-feiras gordas
mas vem a cinza de toda quarta
e leva as bandeiras hasteadas
para secarem em outros varais

e no chão
arquiteto
a vida jaz 


sábado, 16 de novembro de 2013

Poema para minha mãe

Ela disse:
-Hoje encerro o tempo da poesia.
Mas a poesia é ciclo vicioso
é rio e não para de correr

Ela insiste em fechar as janelas
porém a luz do corredor estará sempre acesa
como as vozes das crianças, as cantigas e brincadeiras sem fim

O tempo das dores chegou mais cedo
Maria,
poderia perguntar pela rosa
você não gosta de rosas
só se estiverem bem plantadas no jardim

o jardim
é quase escasso
mas há um banco de praça com Pau-brasil sombreando
enquanto houver banco, praça, vasos...
haverá semente para fomentar versos

E alguém falará das doenças
você esconderá as suas
e as meninas bagunçam e agitam os ventos

os verbos se confundem
Pretérito perfeito, imperfeito
tanto faz
temos o futuro do presente - dedilhando-
e ele se fia com palavras
mesmo que desfiemos em lamas de várzea
mesmo que a dureza da vida coloque pedras sobre o colorido dos fonemas

não é possível enterrar vida
sepultamos apenas o que morre
e até a morte em nós renasce





quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Para os que perderam um amor, os sonhos, uma pessoa querida, o patrimônio, a coragem, o emprego, a razão...uma prece. Porque a vida é desconstrução, é desabamento, porém mais forte que tudo é o movimento factual, é a fé, é o cimento, é a linha, é o traço o qual delineamos, conforme a precisão que temos em nossas mãos. Que cada um possa construir a sua Pasárgada.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

nota de pesar

Depois de muito tempo, hoje, escolhi escrever o tempo. O tempo maldito e a quem sempre recorremos pedindo um pouco mais ou bis.

Nós estamos constantemente compondo cantigas de maldizer para nós mesmos todos os dias. Reclamamos, lamentamos, sofremos. Mas não há nada, nada que seja mais difícil do que a dor da perda. Essa cultura famigerada criada por nós ocidentais de tratar a morte como algo dramático e opressivo é que faz de nossas despedidas uma dor inestimável e como dói "perder" alguém amado.

Estou aqui madrugada a dentro tentando escrever minha dissertação sobre a morte, tentando digeri-la e aceitá-la pelos versos do ilustre, genial e singelo Manuel Bandeira, mas eis que invento de entrar no facebook (problemas do mundo moderno) e vejo uma nota de pesar de um amigo, com uma foto de sua bebê e frase de despedida com legenda "um anjo voltou ao céu" era mais ou menos assim que dizia, não sei direito porque desabei. Desabei como há muito não fazia. Desabei porque vi pais tristes, porém conscientes de sua missão como pais, compreensivos e saudosos. Devolvendo sua filha para as mãos do criador.

Eles me fizeram ter a certeza de que "escolhi" o tema certo (na verdade o tema me escolheu). Embora, as linhas fiquem embargadas, o pensamento não corra direito, pois eu senti a dor do outro. A dor que não posso fragmentar. Sou amiga distante, dos tempos sadios e felizes da infância, estes já estão na janela do passado. Mas a compaixão é algo que une os tempos distintos, os tempos desestruturados e desconexos.

Hoje, minha palavra é uma prece.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

o perfume do medo
invade a tarde cheia de sol
criando ambiguidades nas cores

ensaio os versos para Joaquim
enquanto o carrasco me espera do lado de fora

se é foice ou noite tranquila
só o tempo dirá
e a sentença da vida

a rima se aniquila em sonetos de outra época
a procura é pela lira dos becos
mas é só o medo
o medo sujeito da respiração do palavriado incógnito
amarro a fita vermelha enquanto o mundo é chama
e o chão de cajaranas me chama para ver as folhas dançarem ao vento

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Só se compreende o que é vazio
quando se desaprende a chorar
é só o nó na garganta
não ata
não desata
não costura
nem desfia
passa o tempo
passa a memória
a dor não passa e não fere
é ver a margem do rio
sem pedras
deixando as perdas
perderem-se. 

sábado, 5 de outubro de 2013

perdi o tato com as palavras
sinestesia sem sabor
preparo, aprumo e rimo
e o verso é um deserto

vazio

uma canção ao longe
percussão
sem muito brio

vazio


quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Procurando poesia
em um romance
o fluxo da consciência
tange
outros gêneros
outros meios
ao meio
busco inteirar-me
na eternidade
sou
serei
sempre
metade

terça-feira, 10 de setembro de 2013

ilusão

desilusão
catei saudades por tanto tempo
procurei palavras, pistas, meios e reservas
volúvel
um amor a cada primavera

rotina
"se meu mundo caiu eu que aprenda a levitar"
e assim uma mão estendida me faz suportar os espinhos
e vivemos abismos, luares e marés com aparador de chuvas

a vida
esse chororô eterno
eu quero o riso do homem moderno
o deboche
a saparia satirizando o passado
eu, rio
meu ontem atormentado

palavras, palavras, palavras
o mundo platônico lhe consumiu
o presente jamais será satisfatório
a realidade nunca é

afasta de mim a fantasia
cálice
entornando versos mortos
enterrando-os
em bocas
caladas
já não dizem
já não dizem mais nada



sexta-feira, 6 de setembro de 2013




Eu quero uma casa no campo
para escrever
ouvir canções com cheiro de manhã
sem o vizinho desafinado cantando ao som de um jazz esquisito
Não quero nem grafites. Nem palpites.
só os dias de minha vida, só.

Flores de raíz
chão, terra, perfume de chuva
todos os dias
eu quero uma casa no campo
e me urbanizo cada vez mais. Asfaltos, carros e eu corro atropelando o mundo e me deixando para trás.

os pés mergulham
o mar é denso
e melancólico

a vida é o amanhã
confusões mentais
o idiota - me converto
e adormeço

nenhuma linha vertida
nenhum verso derramado
só as cortinas de renda esvoaçam o tempo

uma cozinha sem jantar
uma mesa cheia de livros
estante sobrando espaço
para um enredo qualquer

desenredo, um sol.
azul para tecer
a moça que se fiou
e desfia. 

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Desarticulação

 Meu descompromisso com a formalidade me banaliza
 Tanto que formalizo o descompasso das palavras
 Articulo o que não tem articulação
 Por que Deus resolveu me mandar assim? Sem eixo.

Deixo, desdigo e digo:
meu cérebro é meu inimigo!
Como se não bastasse isso
vivo no mundo das cobranças
prazos, laços, teorias, teoremas (sem Pitágoras)
e tudo lança
alabarda na vida da gente

Carlos foi gauche 
e tinha livro de ponto
e a mim o que resta?
Festa de fim de ano com esperança de renovação?
pão no portão de casa deixado por Flávio às seis da matina?
Nada me anima
Somos todos pacientes terminais

Mas é preciso ter rima
diz o poeta parnasiano
E penso na eternidade da alma
refaço a linha
e vou estudar poesia

Manuel me diz: vai encontrar tudo pronto
eu digo: vou desencontrar os pontos



quarta-feira, 3 de julho de 2013

Infinitivo



A vida é mesmo um fio
frágil, fino, fraco
A vida é um vazio
desconcerto, despropósito
Rio
me fio do que posso fiar
palavras vazias
um chão de cajaranas, furto das memórias alheias
um trem que não consigo embarcar
a vida volta
e puxa, solta, arrebata
Para quem é de beber
doses de cachaça
Para quem é de viver
goles de tristeza
E uns despedem-se da existência
                                      [sem querer partir
outros fincam raízes
                                      [sem querer ficar

sábado, 22 de junho de 2013

...

Sem mistérios
eu disse para vida:
quero simplesmente pedra e face
desnudada

se doer, doeu
será uma arranhão qualquer
nada de palavras bonitas e rostos bonitos com baile de máscaras

gosto da feiura
que se admite
sem esconderijos
sem labirintos
a vida escoa
como um rio natural
ainda existe

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Crômpoiesis II

não tenho vocação para Penélope
não sei fiar, nem navegar
só sei um latim ruim
um inglês vago
o português entende meu silêncio
o desastre nas palavras
a evasão literária é composição

como convencer matemáticos e químicos
a advogar a metafísica das letras?
esquecendo regras
entendendo tempos e seus reflexos europeus...

como é difícil amar os versos
e fazer amá-los
com uma identidade que chegou tão tarde
barca do inferno e dos céus
quixadas, quixotes, delírios seus

sem armaduras ou Rocinantes
sigo
sigo adiante
sem saber
qual mundo é meu.

assim sei lá

crômpoiesis

um neologismo barato
como conselho ofertado em cada esquina
autoajuda ajuda a quem?
Ninguém furou o olho do gigante
e foi para o mar.

leio todos os dias livros interessantes
tenho algemas
mas não sou Ninguém para lutar bravamente
rendo-me

alguns reais, aspirina e gripe
prefiro uma gripe a muita gente
mas tenho medo de adoecer
não de adoecer gravamente e acordar morta
vagando atrás da barca
medo de adoecer e fechar portas e janelas
e naufragar em solo

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Estes meus olhos nunca perderam
um sonho, um medo, uma chuva
à noite
tudo dorme
menos eu e um verso à toa
a cama é boa
o pranto nem tanto
o mundo atordoa
a proa, direi-vos
bamba e manca, pende
e a vida, no fim
acaba em samba

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Águas de março de abril

Achei que nunca mais choveriam
águas de março de abril
novamente em meu coração

deságuam
inquietações por baixo do rio cotidiano
um rio grande
em um nordeste seco

pedras de sal e farelos de milho
cultivo o possível



Roda Viva

Insistem em morrer
letras de Chico
avô, avó
os livros

só o barulho não morre
tv alta
o pai já não sabe ouvir
sete crianças entoam vozes desordenadas
no fim de semana

o mundo é uma bagunça
as palavras desencontradas
nenhum capítulo.
Nenhum capitulo?
nenhum capítulo.

a vida, cobranças
contas
cabeças, sentenças
a vida
roda
roda
e não se agiganta feito a música do Buarque
estreita, entristece
e levanta
e caminha
e fortalece a linha. 


segunda-feira, 1 de abril de 2013

...

calma
leveza
âncora
poucas palavras
silêncio operador de máquinas

caderninho de papel
versos soltos
não comprende,
jamais compreenderá seu universo

areia branca
um ano para pisar
tudo é devagar
laço, cabelo e seio

pedra
pedra
pedra
sem ressaca do oceano
ecoam no vento as almas do cotidiano
águas
parábolas
tempo para o relógio
tempo para as contas
tempo para os filhos

tudo é certo
a Vó dizia: "tudo em seu tempo"
Vinícius dizia: "meu tempo é quando"
E quando?
semente
para adubar
período de seca
seca
sertaneja
no litoral

segunda-feira, 18 de março de 2013

...

Nada é para mim
nenhum verso lançado ao mar
só há conversas tolas
de boteco

a vida agora não é chão oceânico
é fundo de rede
e os cinco dias de contas e palavras

não gosto de cicatrizes
nem textos viscerais 
gosto da leveza e da brevidade

O neoclassicismo me corrompe
sou facilmente adulterada
pelo além do horizonte

malas prontas
e correntes ao pé da cama
tudo o que não posso explicar
revisita
estante
livros
verbo
e ponto final
ou talvez reticências? 






terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Poesia



A poesia é dolorosa
versos não rimam com leveza
rimam com travessias obscuras
com chuva encorpada
com becos estreitos
e sombrios
Poesia é vazio.