quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Uma nova fatia





Gente, hoje o aperitivo só terá o aperitivo. Estou muito ocupada com as aventuras culinárias de final de ano e pra ser bem sincera não sou muito ligada a determinadas tradições, porém, no entanto, contudo e todavia, é sempre bom desejar para os outros aquilo que nós queremos que nos seja permitido individualmente.

Então, para vocês desejo todas aquelas coisinhas de praxe: Felicidade, paz, amor e saúde! E não posso me esquecer, desejo também palavras. Sendo assim, ninguém melhor do que Carlos Drummond de Andrade para ilustrar o aperitivo e fechar o ano com chave de ouro:


Aperitivo poético

“Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez com outro número e outra vontade de acreditar que daqui para adiante vai ser diferente...
Para você,
Desejo o sonho realizado.
O amor esperado.
A esperança renovada.
Para você,
Desejo todas as cores desta vida.
Todas as alegrias que puder sorrir.
Todas as músicas que puder emocionar.

Para você neste novo ano,
Desejo que os amigos sejam mais cúmplices,
Que a sua família esteja mais unida,
Que sua vida seja mais bem vivida.
Gostaria de lhe desejar tantas coisas...
Mas nada seria suficiente...
Então, desejo apenas que você tenha muitos desejos.

Desejos grandes...
e que eles possam te mover a cada minuto, ao rumo da sua FELICIDADE!"

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Onde estará o meu amor?




    Quero um beijo apaixonado
Apareça seja lá você quem for o desejado
não quero mais amores vãos
vão embora os sem função alguma
quero chocolates sem flores como complemento
borboletas no estômago
ânsia inflamável
não quero um só beijo apaixonado
quero vários





Aperitivo poético:

Carícia

A pele é o mar:
aqui deságuam
os rios da vida.

A pele é o cântaro:
aqui se guardam
todas as águas,
chuvas de alegria
ou lágrimas.

A pele é o mapa:
aqui se gravam
todos os ventos.

Escreva na pele do outro,
com a ponta dos dedos,
o alfabeto mais antigo,
sussurro,
estrela,
carícia.

(Roseana Murray)


Ser





Ela sempre foi muito chorona. Chorava de medo, de raiva, de dor, de desgosto e de amor. Um dia foi expulsa de si, do seu mundo, do seu quarto neutro de cortinas de cor indefinida e de paredes com telas de paisagens e um planeta terra sobre seus sonhos, terra que lhe abandonou de tanto cavar o chão, então faltou piso, faltou buraco.

Sobrou tristeza, tanta tristeza que forçou o choro e esse não veio. Tanta vontade de inundar o universo... Só conseguiu marejar os olhos, mas nenhuma lágrima caiu.

Ela virou palavra presa, inaudita, semente de mar, correnteza presa.


(Juliana Trentini)





Aperitivo poético:

Nostalgia

Nesse país de lenda, que me encanta,
Ficaram meus brocados, que despi,
E as jóias que p´las aias reparti
Como outras rosas de Rainha Santa!

Tanta opala que eu tinha! Tanta, tanta!
Foi por lá que as semeei e que as perdi…
Mostrem-me esse País onde eu nasci!
Mostrem-me o reino de que eu sou infanta!

Ó meu país de sonho e de ansiedade,
Não sei se esta quimera que me assombra,
É feita de mentira ou de verdade!

Quero voltar! Não sei por onde vim…
Ah! Não ser mais que a sombra duma sombra
Por entre tanta sombra igual a mim!


(Florbela Espanca)

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Manhã




Acordei para regar os passarinhos
Esquecestes o ofício de amanhecer a manhã
Eu vim com o regador e os sininhos
Para esconder o sereno que ficou
E as pegadas das estrelas marcando nossa passagem

O som é todo terno
As cores indecifráveis
Saio nomeando as pedras do canteiro
E seus abraços intermináveis
Sorvem meu corpo preguiçoso e matinal

Acordei para regar os passarinhos
Você ficou enluarado com o sol
Escondeu-se embaixo do lençol
E eu despertei sozinha
Para velar seu eterno sabor estival

Acordei para regar os passarinhos
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...


(Juliana Trentini)






Aperitivo poético:


Universo No Teu Corpo

Eu desisto,
Não existe essa manhã que eu perseguia
Um lugar que me dê trégua ou me sorria
Uma gente que não viva só pra si

Só encontro,
Gente amarga mergulhada no passado
Procurando repartir seu mundo errado
Nessa vida sem amor que eu aprendi

Por uns velhos vãos motivos
Somos cegos e cativos
No deserto do universo sem amor

É por isso que eu preciso
De você, como eu preciso
Não me deixe um só minuto sem amor

Vem comigo,
Meu pedaço de universo é no teu corpo
Eu te abraço, corpo imerso no teu corpo
E em teus braços se unem versos à canção

Em que eu digo,
Que estou morto pra este mundo antigo
Que meu porto, meu destino, meu abrigo
São teu corpo amante, amigo em minhas mãos.

(Taiguara)

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Tema Roubado




Desejo

abro a porta e quero engolir o mundo
não me satisfazem as molduras nas paredes da casa
nem os livros da estante tantas vezes já lidos

abro a janela e quero mastigar as nuvens
feito criança com algodão doce nas mãos
destelho o teto e parto quebrando o tempo

caçador de fases lunares
de estrelas cadentes
de naves espaciais
de sonhos e ilusões

desiludido
de possuir limitações
insatisfeito
triste de quem se conforma
com a dor instalada no peito

arranco o desengano das minhas entranhas
e desenganado vivo a procurar razão
há de existir algo melhor, amor maior
para quem não estaciona na primeira vaga que a vida exibe


(Juliana Trentini)





Aperitivo poético:






Segundo - O Quinto Império


Triste de quem vive em casa,
Contente com o seu lar,
Sem que um sonho, no erguer de asa,
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar!

Triste de quem é feliz!
Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raiz -
Ter por vida a sepultura.
Eras sobre eras se somem

No tempo que em eras vem.
Ser descontente é ser homem,
Que as forças cegas se dormem
Pela visão que a alma tem!

E assim, passados os quatro
Tempos do ser que sonhou,
A terra será teatro
Do dia claro, que no astro
Da erma noite começou.

Grécia, Roma, Cristandade,
Europa - os quatros se vão
Para onde vai toda idade.
Quem vai viver a verdade
Que morreu D. Sebastião?

(Fernando Pessoa)



quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

A canção que você pediu






Todos os dias ele olhava atento seus cadernos, livros, agendas, sempre procurando a si nos versos que ela largava nos papéis. Mas ela não o amava, talvez nunca o tenha amado; no entanto, isso é apenas uma hipótese, pois quando o amor acaba, há sempre a sensação de que ele jamais existiu.

Ele se via sempre nas estradas, nos oceanos, nas estrelas, nos acasos, nos fatos consumados, nos medos, nas certezas e nas dúvidas que ela ilustrava em seus romances. Ele via porque queria enxergar sua importância de alguma forma. Ele era desimportante, ele era o fracasso cristalizado de qualquer rubrica de sonho. 

Ela seguia, satisfeita de ser sozinha e de não sentir saudades do passado. Ele saía conquistando estrelas que encontrava em seu caminho, formando constelações apagadas, fustigadas e tristes. Cada um habitava seu universo peremptório.

Assumindo agora um discurso em primeira pessoa, a personagem rouba a fala do narrador e diz:

“ Essa é a canção que você pediu, que seja um presente que na vida não pude dar, que encontre um olhar que não seja igual ao meu virado para baixo, com abismos e caminhos contraditórios. Encontre braços afetivos sem limitações de espaço, que te impeçam de sentir calor ou frio, encontre aquela estrada que era a fuga da cidade, onde só distingue-se o som do vento e dos bichos durante a noite, em que as cordas do violão traziam palavras cravadas no silêncio, vai e segue essa melodia desconhecida, emitida por quem deseja que aprendas a ouvir a outra voz que sempre há dentro de você e assim visualizará a terceira margem do rio; ela está esperando que possas caminhar sem pisar nos lírios, basta que ames a si e então entenderá que é possível amar ao mundo e alguém”

Notas se desprendiam das paredes, paredes estas que se ergueram e solidificaram ambos em sua individualidade, com suas fotografias emolduradas e cruas nas tradições de deixar uma imagem para os herdeiros. 

(Juliana Trentini)


Aperitivo poético:

Me faça um favor

quero que você me faça um favor
já que a gente nao vai mais se encontrar
cante uma canção que fale de amor
e seja bem fácil de se guardar
(...)
mesmo que as pessoas lembrem de nós
mesmo que eu me lembre dessa canção
nao vai haver nada pra recordar
nada que valeu, que houve de bom
meu jardim, seu quintal
sempre a mesma flor
hoje não, cada um
dentro do seu mundo
navegando contra a solidão

Sá, Rodrix e Guarabira

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Noite







Vou calar minha solidão nas palavras
Cavar nas paredes algum nome
E pichar com a velocidade de um bandido em furto
Um olhar que prendeu o meu
Mas se o meu está preso
Não posso ver qual arte está presente nessa tela
Nem posso afirmar categoricamente quem é ela
Só sei que vem durante a noite
E me mastiga como açoite
Do chicote que outrora nos negros estalava

(Juliana Trentini)

domingo, 13 de dezembro de 2009

Percepção




            Há pessoas que projetam suas imagens no “jogo do enquanto” e outras nos “fardos do depois”. Tudo que se vê diante da íris não é exatidão, é esboço que cada um com sua alma valente ou covarde descobrirá nas entrelinhas marginais que habitam paisagens ou poesia morta.

            Uma canção atravessa o mar vermelho, ou verde, ou azul, dependerá de qual lugar do universo você habita, ou que desejo se projeta no ser que sonha.

            Há de se seguir aquele barco que talvez tenha um ninho cheio de carinho ou braços desnudos de afeição, procuremos o mapa e cada um encontrará a sua estrada inversa cheia de percalços e enganos.

E quando encontrar o porto, abrirá a porta da casa cheia de vento, trazendo toda a poeira cósmica do tempo, arrastando um pouco do mundo de fora para dentro dos azulejos e a fechará novamente.  O que o tempo determina é falsete e o que a alma sonha é verbete guilhotinando as nuvens.

(Juliana Trentini)

sábado, 12 de dezembro de 2009

Descuido




 

O celular tocou. Havia esquecido a hora marcada, ele já estava a sua espera e resmungava a sua demora. Apressadamente, lavou apenas o rosto e escovou os dentes, entrou no elevador; a vizinha do andar de baixo mal a cumprimentou e ainda entrou na cabine com um perfume barato e doce, sabe-se lá se era mesmo perfume barato, mas lhe causou náuseas.

Ainda às tontas, quase cedendo às vertigens, sentou-se no carro e disfarçou o enjôo. Entrou no laboratório, pegou o envelope com o resultado na recepção; não teve coragem de abrir, voltou para o carro e seu pai, com olhar investigativo, perguntou:

- E ai filha, como estão suas taxas? Você sabe que tem que cuidar da sua diabetes.
- Eu sei, pai, mas está tudo certo! Não se preocupe. Pode me levar de volta para minha casa!

Chegou, ligou o som, verde, anil, amarelo, cor de rosa e carvão, abriu o envelope: positivo, mãe solteira, ligou o chuveiro. A água do banho carregou suas interrogações para o ralo e a vida se repetiu com novas afirmações. 
 
 
(Juliana Trentini)



sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Natalidade





No lugar onde nascem as canções, uma morreu. Perdemos o controle de natalidade, não há preservativo para as constelações, então estrelas nascem diariamente e se jogam em sua janela em busca de se refugiarem no ninho desse seu olhar, mas uma não quis abrigo, quis te possuir e faliu, convalesceu. Hoje uma estrela morreu, ela era canção que eu tinha feito sobre você e eu. Hoje a melodia cessou, pois você renegou o que roubei do céu pra te dar porque você não queria a luz do luar, mas sim as conchas do mar.


(Juliana Trentini)

Aperitivo poético:

Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!


(Mario Quintana)

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

sobre três olhares








Presente para Silvia Lima:  





Realidade masculina


Estou cansado de tentar compreender o seu silêncio;  na verdade, é mentira, gosto até do que me inquieta no que diz respeito a você. Porém, observar os astros em um caleidoscópio com lentes embaçadas e uma leve ranhura que me impede de entender quais são as estrelas faz com que meu mundo não tenha órbita.

Até minhas palavras andam confusas, pouco coesas, com vírgulas encaixadas em lugares errados, muitas pausas para tentar ludibriar a agitação do meu sangue, e eu tento dominar o seu impulso de correr tão aceleradamente; no entanto, não há freio de mão para essa volúpia ardente, dominante tanto do corpo quanto da alma.

E observar você assim tão descrente dos meus sentimentos, risonha, cheia de luz é o que mais me incomoda e me deixa assim tão confuso. “Te ver e não te querer, é improvável, é impossível” e essa “bruta flor do querer” me faz ser prisioneiro de mim mesmo e habitar uma realidade conflitante, eu quero, mas não posso querer e vou me ausentando e ficando distante, quando na verdade o que eu quero é estar perto e assim quando me vejo estou coberto pelo seu olhar, abrigado no seu cheiro, segurando o seu quadril.



Realidade feminina


Não. Eu não me apaixono e ponto final. Sou aventureira, errante, não gosto de amarras, se o amor é livre, por que se prender a alguém? Não, eu não me apaixono. Há quem diga que isso é fuga, mecanismo de defesa, não concordo. Simplesmente é assim que acontece, aliás, tem acontecido ao longo desses anos todos de estrada. Mas eis que um dia todo o meu discurso de mulher irredutível foi por água abaixo, não porque me apaixonei, pois isso não existe para mim, a paixão, o amor e todas essas regrinhas bobas de classificar o sentimento são imposições que alguém criou, e quanta estupidez! Essa alegria triste que me habita não tem classificação, não pertence a um único nome, só sei que tudo se transforma quando o vejo e não consigo sequer descobrir qual a cor do seu olhar.

A única atitude possível para mim é observar e esperar, logo eu, que sempre fui tão impulsiva, inaugurei uma palavra que antes não existia no meu dicionário: “paciência”. E várias músicas aparecem como trilha sonora dessa novela mexicana sem os excessos que lhe são característicos. “Enquanto todo mundo espera a cura do mal/ e a loucura finge/que isso tudo é normal/eu finjo ter paciência (...)”, tudo bem, fingir é comigo mesma, sou atriz nata, mesmo sem ter pisado sequer em um palco na vida, mas me cansa, cansa e como cansa e observar você assim tão impassível é o que mais me dói, é nessas horas que tenho vontade de mandar a paciência às favas, o que adianta esperar se não sabemos se teremos esse tempo a perder... ai, Lenine, queria que ele prestasse mais atenção nessa sua música, mas o que falta para ele perceber? Talvez falte o verbo querer e eu permaneço nessa fraude do sorriso.

E eis que outra música se manifesta na minha cabeça [ai que saco! Não aguento mais musiquinhas romantiquinhas]. “Te ver e ter que esquecer é insuportável é dor incrível”. Tudo bem, apesar de ser mamão com açúcar, a canção tem razão, é insuportável, porém a maestria do disfarce feminino utiliza o olhar algoz e a força dos quadris para desfilar em sua direção e fazer de conta que o mundo ali é todo seu e que ele, o “desejado”, sequer existe.



Narrador-onisciente


Qual o sentido de querer o tempo todo fingir ser aquilo que não é? Sentir o que não se sente? Demonstrar a realidade oposta? Os personagens encabeçam um jogo de sedução sem propósito, pois são covardes e assim contraditórios, tal qual o amor ou paixão, e se nem eles sabem definir o que sentem, quem dirá eu, um mero narrador onisciente? Mas deixe-me mudar a forma do meu discurso senão acabarei me tornando narrador-personagem e eu não quero depositar meus sentimentos em uma história que não é minha.

Bom, essa é uma história que não vai ter fim e se chegar a ter, desconheceremos, pois o escritor parou por aqui, a única coisa que podemos saber é que dificilmente eles ficarão juntos devido a falta de coragem de ambos de enfrentar os seus dilemas, de abrir o jogo, de dar a cara a tapa, enfim, as razões não sabemos, mas eles permanecem nesse impasse por algum motivo e o possível caminho é o fim, de maneira crua, sem palavras e sem explicações, o que permanecerá é uma saudade dorida e um olhar arroxeado encoberto por um falso sorriso belo e cheio de luz.

Como dizia o poeta: “Quem nunca curtiu uma paixão, nunca vai ter nada não”.


(Juliana Trentini)


segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Narcísica



Diário da Ju III


“Tropeçavas nos astros desastrada
  Sem saber que a ventura e a desventura
   Dessa estrada que vai do nada ao nada
    São livros e o luar contra a cultura”

(Caetano Veloso)



Não. Não é egocentrismo, aliás, essa palavra me enoja um pouco, sempre procuro a variedade em si, dentro de um único ser que me habita, ser tantas em uma única carcaça é o que me alimenta constantemente.

E por que usar tanto a primeira pessoa? Simples, há um número a mais. Envelheci. Isso me assusta um pouco? Sim. Não pelo medo das rugas ou por achar que o tempo está passando depressa demais, isso não me amedronta, acho que “toda idade tem prazer e medo”, mas sinceramente, eu até ano passado odiava fazer festinhas de aniversário, tantas pessoas dizendo “parabéns”, mas por que parabéns? Eu não tive mérito nenhum! Apenas a coitada da minha mãe que por sinal sofreu muito no meu parto e eu ainda vim na condição de “acidente”. O fato é: alguma coisa mudou, não sei a razão, porém esse ano, resolvi ter bolo, amigos perto, cervejinhas, feijoada...E qual a razão?

A razão é ainda mais simples, descobri que fazer o que todo mundo faz não é tão ruim assim, afinal é apenas um dia que a gente “escolhe” para ser nosso e para festejar a vida de maneira mais particular e sociável ao mesmo tempo. Mas que graça teria envelhecer, senão existissem os amigos para compartilhar cada instante? Para falar besteira, rir, brincar, tomar banho de piscina, chorar, comer bolo, cantar e amar amar amar amar sem vírgulas ou ponto final. Pois a alma não é efêmera como o corpo e que a carne envelheça, pouco me importa!Minha alma já tem juventude engarrafada demais para guardar e distribuir todos os sonhos.

(Juliana Trentini)




Aperitivo poético que me representa nesse momento "eu" :

Alma errada


Há coisas que a minha alma,
já mortificada não admite:assistir novelas de TV
ouvir música Pop
um filme apenas de corridas de automóvel
uma corrida de automóvel num filme
um livro de páginas ligadas
porque, sendo bom,
a gente abre sofregamente a dedo:
espátulas não há…
e quem é que hoje faz questão de virgindades…
E quando minha alma estraçalhada a todo instante pelos telefones
fugir desesperada
me deixará aqui,ouvindo o que todos ouvem,
bebendo o que todos bebem,
comendo o que todos comem.
A estes, a falta de alma não incomoda.
(Desconfio até que minha pobre alma fora destinada ao habitante de outro mundo).
E ligarei o rádio a todo o volume,
gritarei como um possesso nas partidas de futebol,
seguirei, irresistivelmente,
o desfilar das grandes paradas do Exército.
E apenas sentirei, uma vez que outra,
a vaga nostalgia de não sei que mundo perdido… 


(Mário Quintana)