quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

A canção que você pediu






Todos os dias ele olhava atento seus cadernos, livros, agendas, sempre procurando a si nos versos que ela largava nos papéis. Mas ela não o amava, talvez nunca o tenha amado; no entanto, isso é apenas uma hipótese, pois quando o amor acaba, há sempre a sensação de que ele jamais existiu.

Ele se via sempre nas estradas, nos oceanos, nas estrelas, nos acasos, nos fatos consumados, nos medos, nas certezas e nas dúvidas que ela ilustrava em seus romances. Ele via porque queria enxergar sua importância de alguma forma. Ele era desimportante, ele era o fracasso cristalizado de qualquer rubrica de sonho. 

Ela seguia, satisfeita de ser sozinha e de não sentir saudades do passado. Ele saía conquistando estrelas que encontrava em seu caminho, formando constelações apagadas, fustigadas e tristes. Cada um habitava seu universo peremptório.

Assumindo agora um discurso em primeira pessoa, a personagem rouba a fala do narrador e diz:

“ Essa é a canção que você pediu, que seja um presente que na vida não pude dar, que encontre um olhar que não seja igual ao meu virado para baixo, com abismos e caminhos contraditórios. Encontre braços afetivos sem limitações de espaço, que te impeçam de sentir calor ou frio, encontre aquela estrada que era a fuga da cidade, onde só distingue-se o som do vento e dos bichos durante a noite, em que as cordas do violão traziam palavras cravadas no silêncio, vai e segue essa melodia desconhecida, emitida por quem deseja que aprendas a ouvir a outra voz que sempre há dentro de você e assim visualizará a terceira margem do rio; ela está esperando que possas caminhar sem pisar nos lírios, basta que ames a si e então entenderá que é possível amar ao mundo e alguém”

Notas se desprendiam das paredes, paredes estas que se ergueram e solidificaram ambos em sua individualidade, com suas fotografias emolduradas e cruas nas tradições de deixar uma imagem para os herdeiros. 

(Juliana Trentini)


Aperitivo poético:

Me faça um favor

quero que você me faça um favor
já que a gente nao vai mais se encontrar
cante uma canção que fale de amor
e seja bem fácil de se guardar
(...)
mesmo que as pessoas lembrem de nós
mesmo que eu me lembre dessa canção
nao vai haver nada pra recordar
nada que valeu, que houve de bom
meu jardim, seu quintal
sempre a mesma flor
hoje não, cada um
dentro do seu mundo
navegando contra a solidão

Sá, Rodrix e Guarabira

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