sexta-feira, 17 de abril de 2009

"De súbito aconteço. A madrugada/ Devolve as minhas mãos cotidianas" (Deífilo Gurgel).

Tem dias que nada faz a gente querer sair de casa, seja a boa música, bons amigos, conversa jogada fora, olhares novos ou mesmo olhares antigos.

Há dias em que preferimos o silêncio e as cortinas, a cama chamando convidativa para uma entrega, um encontro célebre com Morfeu e todos os passeios astrais.

Hoje era um dia bom para tomar um banho com sais e canela, perfumar a casa e perfumar a alma, mas foi preferível continuar impura, cheia de desejos e pecados que serão todos confidenciados ao confortável travesseiro.

A travessia espera um dia de trabalho, de sorrisos e sol que virá pela manhã, e a cidade toda se ilumina pela janela ofuscando os segredos de vinho tinto e da queda de energia do dia anterior. Tudo é enigmático, nem ao menos nós mesmos sabemos o que queremos, mas queremos sempre algo.

E essa chuva que cai agora, sou eu perdidamente... me entregando ao casulo, enclausurando-me e escorrendo todos os erros pelos telhados, feito gatos negros cantando um saltimbanco.

O celular eu coloco no silencioso e esqueço as ligações vindas e as não vindas também, nem sempre é bom corromper o silêncio das palavras.


Aperitivo poético de Anchella Monte (minha mãe):



Itinerante

O dia devolve a minha agenda
É preciso fazer as oferendas
À vida: trabalhar e conviver.

O dia põe seu olhar sapiente
Para nada ser esquecido
No cotidiano já estabelecido.

O dia é meu severo vigia
Sabedor dos meus anseios
De deixar tudo pelo meio.

O dia me controla e salva
A minha memória seletiva:
Sei que estou viva.

Mas chega a madrugada
Que embora já bem tarde
Devolve-me a liberdade.

De repente me reconheço
E me aconchego comigo
Querendo ficar no abrigo.

Itinerante assim me ponho
E me permito o que posso:
A necessidade e o sonho.



O meu aperitivo:

com a chuva veio:
palavras mal pronunciadas em espanhol
o vinho tinto
dia atípico

amigos recém nomeados
música ruim
um homem tocando teclado
E um parabéns

dos cabelos saem cupins
E borboletas
Coisas vindas da água

a cidade silencia e para:
são tantas perguntas
e resposta não há pra nada

Engano.
não há pergunta nenhuma
há resposta para tudo

o bom de ser
é não ser coisa alguma
o bom de viver
é não saber
em que silêncio adormecem os verbos
e em qual lã tecemos as dúvidas
em qual fuso furaremos os dedos
ou em qual horário afogaremos os medos

em súbita escuridão me perco
e não há perda alguma
achamos pecados na rua vazia
entre cílios, melodia e coragem
ela pede passagem
e vai erroneamente


(Juliana Trentini)

Um comentário:

  1. Tô muito feliz. Em meio aos anjos (sim, estou no seu quarto), noto uma evolução gigante a cada tentativa. Você nasceu pra isso, já te disse. E olha que eu não sou de alisar, você sabe.

    Meus parabéns e um beijo.

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